Skip to main navigation Skip to main content Skip to page footer

Justiça penal alemã: A política decide quem é condenado.

O advogado criminalista Dirk Sattelmaier avalia a justiça penal alemã. Ele aponta desigualdade de tratamento e manipulação das estatísticas criminais por meio de centrais de denúncia anônimas. Segundo ele, nos tribunais há uma justiça orientada por ideologia já bastante avançada, que contraria o direito à liberdade de expressão. Na noite de quinta-feira, os advogados Viktoria Dannenmaier, Dirk Sattelmaier e Markus Haintz ofereceram, durante uma palestra em Bochum, uma visão aprofundada da justiça penal alemã. Relataram suas experiências como defensores criminais nos tribunais distritais e regionais da Alemanha e avaliaram o tratamento atual das leis e normas jurídicas no país.

A principal questão era saber se a justiça alemã decide de forma independente da política. Os nossos juízes avaliam crimes ou julgam as pessoas com base em sua orientação política?

Os juristas trataram extensivamente da norma oficialmente vigente da liberdade de expressão. Como está a liberdade de expressão na Alemanha diante da crescente prática de alguns políticos alemães de lucrar com opiniões indesejadas de seus cidadãos por meio de ações judiciais? Na primeira parte, a autora relata os conteúdos da palestra do advogado criminalista de Colônia, Dirk Sattelmaier.

Liberdade de expressão, liberdade de imprensa e ausência de censura são garantidas pela Lei Fundamental

Segundo o advogado Dirk Sattelmaier, em sua introdução, o artigo 5º, parágrafo 1 da Lei Fundamental (Grundgesetz – GG) garante a liberdade de expressão na Alemanha. A liberdade de expressão inclui não apenas o direito de expressar livremente a própria opinião, mas principalmente o direito de se informar livremente. Isso também abrange o livre acesso a artigos da imprensa pelos cidadãos, bem como uma liberdade de imprensa, em princípio, sem censura. O texto da lei no artigo 5º, parágrafo 1 do GG afirma:

“Todos têm o direito de se informar livremente a partir de fontes geralmente acessíveis.
A liberdade de imprensa e a liberdade de relato por meio de rádio e cinema são garantidas.
Não haverá censura.”

Algumas leis gerais e tipos penais restringem essa liberdade, incluindo atualmente, por exemplo, o crime de injúria (§ 185 do Código Penal Alemão – StGB), incitação ao ódio popular (§ 130 StGB) e os crimes de propaganda dos §§ 86 e 86a StGB.

Problema: Indefinição do conceito jurídico de "injúria"

O problema com o crime de injúria, segundo Sattelmaier, é a falta de definição clara das normas legais, o que na verdade é proibido pela Lei Fundamental. O tipo penal de injúria seria descrito de maneira muito vaga. Isso tem levado recentemente a uma enxurrada de queixas por injúria por parte de alguns políticos. O cidadão, por conta da indefinição do conceito legal de "injúria", já não sabe mais o que pode expressar sob a proteção da liberdade de opinião. O simples uso do termo “injúria” na lei contraria o princípio de determinação legal exigido pela Constituição.

Justiça ideológica nos tribunais alemães contraria o direito à liberdade de expressão

No tema “Quão política é a justiça penal alemã?”, Sattelmaier deu um exemplo de sua atuação como defensor no chamado processo contra "Reichsbürger". Na mídia, os acusados já eram previamente classificados como inimigos do Estado. Dizia-se: “O Estado deve agir com todo o rigor contra inimigos do Estado.”

Pelas normas jurídicas oficiais, não pode haver justiça ideológica na Alemanha. Ou seja, a opinião de um réu em relação ao Estado não deve importar em tribunal. Apenas ações concretas podem ser julgadas, e não a pessoa ou sua ideologia. Contudo, esse princípio jurídico fundamental tem sido cada vez mais ignorado em determinados processos nos últimos anos – com grande influência da mídia e da sua avaliação ideológica dos acusados.

Aumento dos crimes políticos gerado por centrais de denúncia

Sattelmaier então apresentou um panorama da estatística oficial de crimes politicamente motivados, referindo-se ao comunicado de imprensa mais recente do Departamento Federal de Polícia Criminal (BKA), de 20 de maio de 2025. Segundo os dados de 2024, os crimes politicamente motivados aumentaram 40,22% em comparação ao ano anterior – o maior número desde o início dessas estatísticas em 2001. O novo ministro do Interior, Alexander Dobrindt, declarou em nota oficial a necessidade urgente de uma “ofensiva de segurança” conjunta entre governo federal e estados.

Ao examinar de perto, no entanto, esses números refletem apenas notificações, e não condenações. Há algum tempo existem centrais online de denúncia anônima de "ódio e incitação", onde se pode relatar crimes politicamente motivados. Além disso, policiais enviariam formulários prontos para políticos, que só precisariam assinar e devolver.

Com essa prática de coleta de casos, cerca de 80.000 crimes políticos foram registrados em 2024. Qualquer insulto como "cabeça de vento" direcionado a um político acaba entrando nas estatísticas criminais, desde que alguém se dê ao trabalho de vasculhar a internet. Em 2023, por exemplo, dos cerca de 60.000 casos relatados, 57.000 foram classificados como encerrados pelas promotorias – ou seja, arquivados. Apenas cerca de 3.000 resultaram em processo criminal efetivo.

Dois pesos e duas medidas na Justiça

Como exemplo de tratamento desigual, o advogado de Colônia citou o caso de Karl Lauterbach, acusado de fazer um gesto proibido. Alguém editou um vídeo onde o ex-ministro aparecia com o braço levemente levantado. Em tribunal, corretamente, ficou constatado que, no contexto, não se tratava de uma saudação nazista.

No entanto, uma mulher foi multada em 3.500 euros por um tribunal de Schweinfurt por ter comparado essa imagem de Lauterbach com a de um cidadão comum num cartaz, afirmando que o cidadão fora condenado injustamente. O tribunal entendeu o cartaz como exibição ilegal de saudação nazista.

Outro exemplo: o caso do "cabeça de vento" em Bamberg, onde um idoso foi acusado de injúria contra político com base no § 188 StGB, por compartilhar um meme satírico que chamava o então ministro da Economia de "cabeça de vento profissional". A Justiça autorizou busca domiciliar e apreensão de equipamentos. Sattelmaier argumenta que, dado que não havia indícios de que o meme prejudicava “significativamente” a atuação do político, a busca foi juridicamente injustificável. No entanto, encontraram outros materiais na casa do idoso, o que levou à acusação de incitação ao ódio (§ 130 StGB).

Por outro lado, políticos alemães que insultam cidadãos não são processados. A política do FDP, Marie-Agnes Strack-Zimmermann, pôde chamar cidadãos de "moscas em cima de um monte de merda" – e nada aconteceu. Já a líder da AfD, Alice Weidel, apesar de ser frequentemente alvo de ofensas, não registrou nenhuma denúncia. Strack-Zimmermann, por sua vez, apresentou cerca de 3.000 queixas por injúria no mesmo período.

Tratamento desigual no uso de símbolos proibidos

Sattelmaier também apontou desigualdade no tratamento do uso de símbolos proibidos. Por exemplo, a revista Spiegel pode usar a suástica para alertar contra ideologias de extrema-direita. Já cidadãos comuns que fazem o mesmo são acusados de simpatia nazista. O escritor norte-americano C.J. Hopkins, residente em Berlim, foi condenado por conta da capa de seu livro “The Rise of the New Normal Reich”, por suposta violação ao § 86a StGB.

A vontade de denunciar passaria rápido

Como conclusão, Dirk Sattelmaier afirmou haver uma crescente politização da Justiça penal alemã e um zelo persecutório exagerado por parte das autoridades. Os tipos penais dos §§ 86a e 188 StGB, por exemplo, não existem nos EUA. Parte da solução, segundo ele, seria obrigar os políticos a comparecer pessoalmente às audiências e explicar aos juízes por que se sentiram ofendidos. Na visão do advogado, políticos como Habeck e Strack-Zimmermann perderiam rapidamente o entusiasmo por apresentar denúncias em massa.

Precisa de fazer login para comentar.